quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

Fusão de estrelas de nêutrons gera segunda maior explosão de raios gama

Link para matéria completa: https://revistapesquisa.fapesp.br/fusao-de-estrelas-de-neutrons-gera-segunda-maior-explosao-de-raios-gama/

Marcos Pivetta, da Revista Pesquisa FAPESP

Resumo: Fenômeno produziu no espaço metais do grupo das terras-raras.

Artigo na revista Nature em 21 de fevereiro deste ano, com a participação de brasileiros, fornece mais evidências de que uma explosão de raios gama observada em março de 2023 deve ser decorrente de um evento cósmico raro: a fusão de duas estrelas de nêutrons ou de uma estrela dessa classe e de um buraco negro. A colisão e posterior união de objetos celestes tão densos são denominadas kilonova. Considerada a segunda explosão de raios gama mais luminosa e energética já registrada, a ocorrência do ano passado tinha sido alvo de um trabalho anterior, também publicado na Nature, mas feito por outro grupo de astrofísicos, que apresentou resultados similares aos do mais recente estudo.

A explosão associada a uma kilonova gera gigantescas emissões de luz, sobretudo no comprimento de onda dos raios gama, que são invisíveis ao olho humano. Outra assinatura decorrente da união de duas estrelas de nêutrons é a produção de elementos químicos do grupo das terras-raras, também denominado lantanídeos, que são mais pesados que o ferro. No espaço, apenas a explosão associada a uma kilonova seria capaz de atuar como uma fábrica de terras-raras. Os lantanídeos são forjados a partir de um processo conhecido como captura de nêutrons, que envolve decaimento radioativo e emissões de raios gama, a forma de luz (fóton) mais energética.

“Encontramos evidências de que essa kilonova teria produzido mais lantanídeos estáveis do que esperávamos inicialmente”, diz o astrofísico Clécio De Bom, do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF). Ele é um dos três brasileiros que assinam o artigo, redigido por um grupo internacional de pesquisadores e coordenado por Eleonora Troja, da Universidade de Roma Tor Vergata. Os outros dois são Martín Makler, também do CBPF, e Felipe Navarete, astrônomo que trabalha no telescópio Soar, instrumento de observação instalado no Chile, operado pelo Brasil e por universidades norte-americanas.

Numa kilonova, as emissões de raios gama decorrentes da fusão duram segundos, mas há liberação por dias ou semanas de um brilho residual, o chamado afterglow, em outros comprimentos de onda, como no óptico e infravermelho. Por isso, mesmo telescópios que não operam nas frequências de raios gama, como o Hubble e o James Webb, podem ser acionados para acompanhar o afterglow de eventos extremamente energéticos. “Observamos com o Soar essa kilonova em cinco épocas diferentes”, conta Navarete.

A segunda mais intensa explosão de raios gama foi primeiramente registrada em 7 de março de 2023 pelo satélite Fermi, da Nasa, dedicado a observações nessa faixa de comprimento de onda. O evento foi denominado GRB 230307A. As três primeiras letras são um acrônimo do nome do fenômeno em inglês, gamma–ray burst (GRB). Os números se referem ao ano (23), mês (03) e dia (07) em que o evento ocorreu. O “A” significa que foi a primeira explosão desse tipo vista naquela data.

Além de sua enorme luminosidade, o fenômeno despertou o interesse imediato na comunidade de astrofísicos devido a outras duas peculiaridades: sua duração atípica e a região do espaço de onde partiu a explosão. O forte pulso de raios gama se prolongou por cerca de 35 segundos, o que o situa, segundo a classificação da área, como uma explosão de longa duração. Os eventos desse tipo que duram menos de 2 segundos são considerados curtos; os que ultrapassam esse limite de tempo são tidos como longos.

O problema é que as kilonovas sempre foram associadas a GRB curtos, enquanto os pulsos de raios gama mais duradouros costumam ser produzidos por supernovas. A morte de estrelas de grande massa, um processo que também gera uma forte explosão, é denominada supernova. No entanto, os astrofísicos dos dois grupos independentes que analisaram o GRB 230307A não encontraram nenhuma estrela massiva moribunda no local em que ocorreu o evento.

Essa região é praticamente vazia de objetos e dista cerca de 130 mil anos-luz da galáxia mais próxima. Tal cenário desolador levou os pesquisadores a propor uma explicação para essa incômoda situação: um par de estrelas de nêutrons teria se desgarrado da galáxia-mãe e migrado para uma área vizinha. No meio do nada, as estrelas se fundiram e geraram a espantosa explosão de raios gama de mais de meio minuto.

Segundo a astrofísica italiana Eleonora Troja, nunca se observou uma kilonova e seus desdobramentos por mais de uns poucos dias. “É preciso observar por semanas e meses [como eles fizeram] para descobrir quais metais foram forjados na explosão”, disse a pesquisadora, em comunicado à imprensa sobre o estudo. Como no lugar associado ao GRB 230307A há indícios da formação de lantanídeos, os pesquisadores defendem a ideia de que ali houve uma fusão de dois objetos muito densos e compactos, dos quais ao menos um era uma estrela de nêutrons.

Artigo científico: YANG, Y. et al. A lanthanide-rich kilonova in the aftermath of a long gamma-ray burst. Nature. 21 fev. 2024.

Este texto foi originalmente publicado por Pesquisa FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. 

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Estudo explica como um fungo pode controlar a principal praga que afeta o cultivo de milho

Link para matéria completa: https://jornal.usp.br/ciencias/estudo-explica-como-um-fungo-pode-controlar-a-principal-praga-que-afeta-o-cultivo-de-milho/

Resumo: Publicada na revista Scientif Reports, a pesquisa foi realizada no SPARCBio, um centro constituído pela Fspesp e pela empresa Koppert na Esalq-USP. (Texto: José Tadeu Arantes - Arte: Gabriela Varão - Jornal da USP)

A cigarrinha-do-milho (Dalbulus maidis) tornou-se um problema sério para a agricultura. Esse inseto diminuto está hoje amplamente distribuído nas Américas, desde o sul dos Estados Unidos até o norte da Argentina. No Brasil, ele utiliza apenas as plantas de milho como hospedeiras e ainda são desconhecidos seus mecanismos de adaptação a outros vegetais. Na planta do milho, a cigarrinha causa um dano direto, pela sucção da seiva do floema – o tecido vivo através do qual circulam compostos orgânicos solúveis, em especial a sacarose, pelo corpo vegetal.

Mas esse não é o principal problema: o inseto é também um transmissor de fitopatógenos – bactérias e vírus – que podem causar grandes danos às espécies vegetais, afetar a produtividade e, por decorrência, a produção do milho.

Para combater a cigarrinha-do-milho – reduzindo sua população e principalmente impedindo a transmissão de fitopatógenos para novas plantas hospedeiras –, duas estratégias são habitualmente adotadas: a pulverização com agroquímicos e o controle biológico. Os inseticidas químicos são, de longe, os mais empregados. Mas, diante de seus efeitos colaterais desfavoráveis, o controle biológico vem obtendo crescente adesão.

Um dos agentes bioinseticidas utilizados em produtos atualmente comercializados é o fungo Cordyceps javanica (anteriormente denominado Isaria fumosorosea ou Cordyceps fumosorosea). Essa espécie generalista apresenta alto potencial de controle sobre insetos sugadores. Mas, até agora, não se sabia exatamente como isso acontecia. Para elucidar o mecanismo de atuação do fungo entomopatogênico sobre a cigarrinha-do-milho foi realizado um estudo pioneiro no Centro de Pesquisa Avançada de São Paulo para Controle Biológico (SPARCBio), constituído pela Fapesp e pela empresa Koppert Biological Systems, na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP.

A investigação foi conduzida pela engenheira agrônoma Nathalie Maluta, pós-doutora na área de fitossanidade e pesquisadora da Koppert Brasil. Teve a participação de Thiago Rodrigues de Castro, coordenador de Pesquisa e Desenvolvimento da Koppert Brasil, e de João Roberto Spotti Lopes, professor da Esalq. Os resultados foram publicados na revista Scientific Reports.

“Nosso trabalho evidenciou que o fungo começa a afetar o comportamento da cigarrinha-do-milho dois dias após a pulverização do bioinseticida, reduzindo a atividade alimentar dos insetos nos vasos do floema das plantas de milho, local onde ocorre a transmissão de fitopatógenos”, conta Maluta à Agência Fapesp.

Para obter esse resultado, a pesquisadora aplicou uma técnica, ainda pouco conhecida no Brasil, chamada electrical penetration graph (EPG). Nesta, a cigarrinha de teste, ativa sobre a planta de milho, é conectada a um eletrodo. E a atividade de seu estilete – isto é, da estrutura bucal, semelhante a minúsculos canudos, utilizada para sugar a seiva – pode ser assim monitorada e representada por meio de um gráfico, permitindo a associação das formas de onda produzidas com as atividades biológicas desempenhadas pelos insetos. Guardadas as devidas proporções, o procedimento é semelhante ao do eletrocardiograma, que monitora graficamente a atividade do coração.

“A técnica de EPG gera formas de onda com diferentes características, como nível de tensão, frequência e amplitude, que podem ser correlacionadas com atividades biológicas do inseto. Isso nos permite saber, em tempo real, o que ele está fazendo ou o que está acontecendo com ele – inclusive o efeito do bioinseticida sobre sua atividade sugadora ou transmissora de patógenos”, informa Maluta.


Cigarrinha-do-milho conectada ao eletrodo do sistema de EPG sobre planta de milho. Foto: Nathalie Maluta

A Koppert comercializa, há tempos, um produto bioinseticida que tem como princípio ativo o Cordyceps javanica. E o artigo agora publicado explica seu mecanismo de ação.

“O produto, contendo o fungo, é pulverizado sobre a planta e atinge os insetos ali presentes. Também deixa um filme na superfície vegetal com o qual os insetos que pousam depois entram em contato. De uma maneira ou de outra, o fungo penetra nos corpos dos insetos. Seu efeito inseticida não é imediato. Ele precisa de alguns dias para germinar e produzir esporos, levando o inseto à morte. Mas, bem antes disso, o fungo já começa a afetar os seus comportamentos, inclusive o comportamento alimentar”, relata Maluta.

A pesquisadora afirma que a atuação do Cordyceps javanica é inteiramente específica e não oferece nenhum risco ao consumidor humano ou animal, tanto que seu uso é permitido para cultivos orgânicos. “Esse fungo já existe e atua na natureza. Não foi fabricado em laboratório por manipulação genética”, enfatiza.

Maluta afirma que, além de estar sendo agravada agora pela crise climática, a grande proliferação da cigarrinha-do-milho é uma decorrência direta da expansão da monocultura em larga escala e, principalmente, do uso inadequado das ferramentas de manejo, como o controle químico.

“Ao aplicar inseticidas químicos sem prévio monitoramento e sem saber se há necessidade de entrar com alguma medida de controle, ocorre a seleção de indivíduos resistentes, uma vez que os insetos suscetíveis morrem e os resistentes permanecem no campo, até o ponto em que nenhum instrumento de controle funciona mais. É preciso mudar radicalmente as estratégias de manejo”, diz.

“Esse inseto afeta o milho há muito tempo. Mas, nos últimos anos, sua população cresceu de forma explosiva. Isso também foi afetado pelos cultivos sucessivos. Hoje, temos não só as safras, mas também as chamadas safrinhas, o que aumenta a taxa de proliferação da praga, porque ela tem disponibilidade de comida praticamente o tempo todo”, ressalta.

O artigo DC-electrical penetration graph waveforms for Dalbulus maidis (Hemiptera: Cicadellidae) and the effects of entomopathogenic fungi on its probing behavior pode ser acessado em: www.nature.com/articles/s41598-023-48779-x.

*Da Agência Fapesp, adaptado para o Jornal da USP

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Veneno de aranha brasileira vira esperança de tratamento contra câncer

Link para matéria completa: https://g1.globo.com/saude/noticia/2024/02/25/veneno-de-aranha-brasileira-vira-esperanca-de-tratamento-contra-cancer.ghtml?utm_source=share-universal&utm_medium=share-bar-app&utm_campaign=materias

Por André Biernath

Resumo: Pesquisa realizada há mais de 20 anos detectou no organismo de espécie típica do litoral paulista uma molécula que possui atividade contra tumores. A ideia é continuar os testes em células e cobaias para comprovar segurança e eficácia da substância.

O veneno produzido por uma aranha brasileira serviu de inspiração para uma pesquisa que busca novas formas de tratar o câncer. O trabalho, conduzido há cerca de 20 anos por cientistas do Hospital Israelita Albert Einstein e do Instituto Butantan, em São Paulo, avalia o potencial terapêutico de uma substância obtida a partir da Vitalius wacketi, uma aranha que habita o litoral paulista.


O candidato a remédio oncológico, porém, não é feito diretamente do veneno: as moléculas foram isoladas, purificadas e sintetizadas em laboratório, a partir de técnicas desenvolvidas e patenteadas pelos especialistas brasileiros. Nas pesquisas iniciais, a molécula em teste mostrou-se promissora no combate à leucemia, o tipo de tumor que afeta algumas células sanguíneas. Ela também apresentou algumas vantagens estratégicas quando comparada aos métodos disponíveis atualmente para tratar essa doença, como a quimioterapia.

No entanto, os estudos com a substância ainda estão nos estágios preliminares. É preciso experimentá-la em mais células e cobaias para observar a segurança e a eficácia — para só depois começar os testes clínicos com seres humanos. Os profissionais dizem que já negociam com empresas farmacêuticas para fazer parcerias e obter os investimentos necessários para seguir adiante.

Décadas de investigação

Essa história começa há cerca de três décadas, quando cientistas do Instituto Butantan fizeram uma série de expedições pelo litoral de São Paulo. 

Nós geralmente éramos chamados para regiões em que aconteciam movimentações, como o corte de árvores e desmatamento. Nessas visitas, fazíamos a coleta de aranhas. Pedro Ismael da Silva Junior, biólogo do Laboratório de Toxinologia Aplicada do Butantan

Outro integrante dessas expedições era o aracnólogo Rogério Bertani, também do Butantan, que fez estudos e reclassificações taxonômicas da Vitalius wacketi — e outras aranhas — da década de 1990 em diante.

Alguns anos depois, entrou em cena o bioquímico Thomaz Rocha e Silva, que hoje trabalha no Einstein. Quando ele estava terminando a formação acadêmica, no início dos anos 2000, resolveu investigar as possíveis atividades farmacológicas de algumas substâncias encontradas no veneno dessas espécies.

"Ao estudar aranhas do gênero Vitalius, encontramos no veneno uma atividade neuromuscular. Fomos atrás da toxina responsável por esse efeito, que era uma poliamina grande e instável", lembra ele.

As poliaminas citadas pelo pesquisador são moléculas presentes no organismo de plantas, animais e micro-organismos. Essa investigação foi publicada em periódicos acadêmicos, mas, como não havia um interesse comercial imediato na molécula, o projeto acabou engavetado.

"Anos depois, me estabeleci numa faculdade e um aluno me disse que gostaria de estudar o potencial citotóxico desses mesmos venenos", conta Rocha e Silva.

Os cientistas resolveram fazer um painel de testes e análises para avaliar as toxinas encontradas em várias aranhas do gênero Vitalius. E vimos que uma toxina encontrada na Vitalius wacketi possuía uma poliamina pequena e com uma atividade bastante interessante.

Essa molécula foi isolada e purificada por Rocha e Silva — depois, Silva Junior conseguiu sintetizá-la, ou seja, criou uma versão química idêntica, sem a necessidade de extraí-la diretamente da aranha. Na sequência, essa substância passou por testes in vitro. Na bancada do laboratório, ela foi colocada junto de células cancerosas, para ver qual ação teria. E a atividade da molécula contra as unidades doentes foi considerada "importante" para os especialistas.

Isso porque o candidato a fármaco causou a morte das células cancerosas por meio de um processo chamado apoptose — geralmente, os tratamentos oncológicos mais tradicionais provocam uma necrose.

"Quando ocorre a necrose, a célula sofre um colapso, o que gera uma reação inflamatória com efeitos no organismo", explica Rocha e Silva.

"Já a apoptose, ou a morte programada das células, é um processo muito mais limpo. É como se as células implodissem de forma controlada", compara ele. Na apoptose, o sistema imunológico "é avisado" sobre o colapso dessas células — e isso gera uma reação bem mais controlada, sem grandes impactos para outros órgãos e tecidos.

Até existem opções terapêuticas capazes de provocar a tal da apoptose nas células do câncer — é o caso, por exemplo, dos anticorpos monoclonais. Mas esses fármacos são mais difíceis de produzir e costumam ter um preço elevado. A molécula desenvolvida a partir do veneno de aranha é sintética, o que facilita a fabricação (e reduz os custos).

"Além disso, ela possui algumas características físico-químicas que facilitam a permanência no sangue e depois a excreção com facilidade pelos rins", acrescenta Rocha e Silva.

A poliamina foi testada inicialmente contra a leucemia, mas há uma expectativa de analisar qual será a atividade dela contra outros tipos de tumores.

Os próximos passos

Após essa análise in vitro que teve resultados promissores, as equipes de inovação das instituições correram para fazer as patentes e garantir a propriedade intelectual da novidade. A farmacêutica Denise Rahal, gerente de parcerias e operações do Health Innovation Techcenter do Einstein, explica que a patente tem a ver com o processo de purificação e sintetização que foi desenvolvido pelos pesquisadores — e não com a molécula em si.

Eu não posso patentear algo que já existe na natureza, como é o caso do veneno da aranha ou das toxinas presentes nele. Mas a síntese, o processo de obtenção dessa molécula, é um produto que foi desenvolvido a partir dessas pesquisas.

Cristiano Gonçalves, gerente de Inovação do Butantan, acrescenta que as instituições estão em contato com parceiros para licenciar a tecnologia e seguir com as pesquisas. "Nem o Einstein nem o Butantan tem capacidade de produção da molécula, mesmo que seja para gerar o material necessário para os testes clínicos de fase 1", diz ele. "Estamos em contato com parceiros para desenvolvermos juntos essa tecnologia", complementa Gonçalves. Rahal destaca que esse estudo em específico traz ainda mais um atrativo: ele tem como base e inspiração a biodiversidade brasileira.

"Nosso trabalho é justamente tirar essas pesquisas do papel e trazê-las para o benefício da sociedade", pontua ela.

Do ponto de vista científico, os especialistas desejam começar análises que vão desvendar o mecanismo de ação da poliamina. Eles querem entender a forma exata que ela age, de modo a matar as células com câncer.

A substância também precisará ser avaliada em cobaias, para avaliar a eficácia e a segurança dela em organismos mais complexos do que um conjunto de células. Se esses testes forem bem-sucedidos, o projeto evolui para a chamada fase clínica, dividida em três etapas diferentes. O objetivo aqui é estudar como a substância age em seres humanos — e se realmente pode funcionar como um tratamento contra o câncer. Caso os resultados sejam de fato positivos, a droga poderá finalmente ser submetida à aprovação nas agências regulatórias, como a Anvisa, para ser usada em clínicas e hospitais.

Questionado sobre o significado de fazer investigações do tipo com a biodiversidade brasileira, Silva Junior destaca a "experiência" longeva de algumas espécies. "Alguns dos aracnídeos surgiram há 300 ou 350 milhões de anos, e os trabalhos mostram que eles mudaram muito pouco desde então", estima ele. "Para sobreviver a esses milhões de anos, eles certamente desenvolveram estratégias para protegê-los das ameaças de ambientes inóspitos." "E nós podemos hoje em dia estudar como essas características e habilidades aparecem na biodiversidade brasileira, que é a maior do mundo, para encontrar essas moléculas que podem nos ajudar futuramente contra uma série de doenças", conclui ele.

terça-feira, 20 de fevereiro de 2024

Fiocruz: indígenas Munduruku apresentam níveis alarmantes de mercúrio no corpo

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Resumo: Além do alto risco de adoecer, a contaminação pode impactar no desenvolvimento das crianças O post Fiocruz: indígenas Munduruku apresentam níveis alarmantes de mercúrio no corpo apareceu primeiro em AlmaPreta. Por: Mariane Barbosa

Uma pesquisa conduzida pela Fiocruz revelou níveis alarmantes de mercúrio no corpo de indígenas que habitam o interior do Pará. Os resultados constataram que os peixes estavam contaminados por mercúrio e, como consequência, o povo Munduruku também foi contaminado.


Para confirmar o estudo sobre a maior população indígena do estado, com mais de 9,2 mil pessoas, amostras de cabelo dos Munduruku foram analisadas pela instituição. Só em uma aldeia, oito pessoas apresentaram níveis alarmantes de mercúrio no corpo. Alguns o dobro, um deles o triplo do aceitável pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Segundo os especialistas, além do alto risco de adoecer, a contaminação pode impactar no desenvolvimento das crianças, uma vez que elas podem nascer com deformidades, má formação congênita, diferentes anomalias e apresentar paralisia cerebral.

Os pesquisadores da Fiocruz acompanham de perto 80 crianças Munduruku. Um grupo de neuropediatras da USP e de Harvard também analisamos casos.

O mercúrio é usado por garimpeiros na purificação do ouro. A terra indígena Munduruku, em Jacareacanga, no Pará, é a segunda com maior área de garimpo no país, segundo estudo da ONG MapBiomas.

Conforme informações do Ministério da Saúde, o Distrito Sanitário Especial Indígena Rio Tapajós tem implementado ações de monitoramento para acompanhar pacientes que apresentam altos teores de contaminação por mercúrio.

sábado, 17 de fevereiro de 2024

Estudo mostra como mitocôndrias regulam a autofagia, processo fundamental para equilíbrio celular

Link para texto completo: https://jornal.usp.br/ciencias/estudo-mostra-como-mitocondrias-regulam-a-autofagia-processo-fundamental-para-equilibrio-celular/ - Jornal da USP

Resumo: Trabalho estabeleceu a ligação entre a autofagia – degradação e reciclagem de componentes celulares – e o cálcio mitocondrial, dois processos fundamentais na regulação do metabolismo energético.

Liderados pela professora Alicia Kowaltowski, do Instituto de Química da USP (IQ), cientistas do centro de pesquisas Redoxoma estabeleceram a ligação entre a autofagia e o cálcio mitocondrial, dois aspectos fundamentais na regulação do metabolismo energético da célula.
Eles demonstraram que o transportador responsável pelo efluxo de íons de cálcio das mitocôndrias, chamado NCLX, é um importante nó regulador que integra estas organelas, controle de autofagia por íons de cálcio e respostas celulares à disponibilidade de nutrientes.
“Esse trabalho é importante porque fizemos o link entre esses processos. Como tanto a mitocôndria quanto a autofagia estão envolvidas no metabolismo, faz sentido que exista uma coordenação entre elas. Normalmente quando a gente estuda biologia celular, as coisas são vistas separadas e precisamos lembrar que, nas células, um processo depende do outro, regula o outro”, afirmou Vitor de Miranda Ramos, que propôs investigar a ligação entre esses processos durante seu doutorado e é o primeiro autor do artigo recém publicado. Apesar de ser um trabalho de ciência básica, “que parece meio abstrato”, ele acredita que o conhecimento possa ser usado no contexto do tratamento de doenças.
Além de gerarem energia para as células, as mitocôndrias participam diretamente de diversas de vias de regulação celular sensíveis ao cálcio, pois são capazes de captar, absorver e liberar íons de cálcio. A captação de íons de cálcio pelas mitocôndrias é mediada pelo “complexo uniporter mitocondrial de cálcio” (MCU), enquanto o “trocador mitocondrial Na/Li/Ca” (NCLX) move íons de cálcio da região da matriz mitocondrial para o espaço entre a membrana interna e a externa, em troca de íons de sódio”.
O cálcio afeta quase todos os aspectos da vida celular. Íons de cálcio são segundos mensageiros conhecidos na sinalização metabólica e desempenham um papel importante na regulação da autofagia, que é um processo de degradação e reciclagem de componentes celulares, com o papel fundamental de manutenção do equilíbrio celular.
O trabalho envolveu experimentos com camundongos, permitindo usar células de fígado em culturas e isolar as mitocôndrias para a realização de testes.

Perspectivas
A diminuição da expressão de NCLX foi observada em algumas doenças, como Alzheimer e Parkinson. “Já foi visto que pacientes que morreram com a doença de Alzheimer tinham menos NCLX. Em modelos animais, quando os pesquisadores revertem para níveis de NCLX normais, eles conseguem melhorias”, diz Ramos.
O cérebro usa muita energia e precisa de muitas mitocôndrias. O acúmulo de danos nas células pode levar à morte celular e ao desenvolvimento de patologias. “Apesar de não termos olhado especificamente para contextos patológicos, esse link entre a sinalização de cálcio e a autofagia é interessante porque pode ser uma ideia de progressão em alguma doença. Ao perder a atividade desse transportador, mais danos são gerados, e o processo para limpar esses danos – a autofagia – está prejudicado. Isso abre perspectivas para trabalhos futuros,” afirmou Alicia Kowaltowski.

domingo, 4 de fevereiro de 2024

Aumenta nos hospitais brasileiros a presença de bactérias resistentes a antibióticos

Link para matéria completa na Revista Pesquisa Fapesp: https://revistapesquisa.fapesp.br/aumenta-nos-hospitais-brasileiros-a-presenca-de-bacterias-resistentes-a-antibioticos/

Revista Pesquisa Fapesp - Edição 335 - jan. 2024

Resumo: Nazareno Scaccia calçou um par de luvas, apanhou um balde de aço esterilizado e o atou à extremidade de uma corda. Em seguida, baixou-o até o fundo da galeria que recebe o esgoto dos bairros centrais de São Caetano, na Região Metropolitana de São Paulo, antes de içá-lo cheio de uma água levemente turva, com coloração amarela-acastanhada e odor desagradável. Armazenou o líquido em um galão plástico e usou uma seringa acoplada a um filtro para preencher um pequeno frasco. “Fazemos isso para separar os microrganismos e evitar que degradem os compostos químicos presentes na água”, explicou o microbiologista italiano, que faz estágio de pós-doutorado na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP). Algumas bactérias são capazes de digerir o princípio ativo dos antibióticos, o que atrapalha a detecção desses compostos na água.


Naquela manhã de 6 de novembro, Scaccia e as biólogas Miriam Lopes da Silva e Francisca Peternella ainda percorreriam outros oito pontos da cidade vizinha a São Paulo repetindo o procedimento. A água coletada da torneira, de riachos e do esgoto comum e hospitalar seria depois levada a um laboratório na Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP para verificar a presença de bactérias resistentes a antibióticos. O trabalho é parte de um projeto internacional, coordenado no Brasil pela infectologista Anna Sara Levin, da FM-USP, que se destina a avaliar se a prescrição e o uso adequado desses medicamentos podem reduzir o surgimento e a dispersão de microrganismos contra os quais os antibióticos não produzem mais o efeito desejado.
A disseminação de bactérias e outros microrganismos resistentes a quase todos os antimicrobianos disponíveis é um pesadelo mundial. Ela ocorre desde que os primeiros antibióticos começaram a ser usados e avança rapidamente, tirando o sono dos especialistas por representar uma ameaça a uma das maiores conquistas da medicina moderna: a capacidade de debelar infecções. Sem antibióticos eficientes, fica quase impossível realizar cirurgias, transplantes e tratamentos quimioterápicos contra o câncer em segurança. Problemas comuns, como um corte mais profundo ou uma infecção respiratória, podem se tornar uma ameaça à vida.
“Poucas intervenções aumentaram tanto a longevidade humana quanto a oferta de água tratada e o desenvolvimento de vacinas e antibióticos”, conta o infectologista Arnaldo Lopes Colombo, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que coordena o Instituto Paulista de Resistência aos Antimicrobianos, um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) apoiados pela FAPESP. Algumas estimativas indicam que o uso de antibacterianos para tratar infecções aumentou a longevidade humana em cerca de 20 anos.
Antibióticos são compostos químicos que inibem o crescimento de bactérias ou as matam. Agem apenas contra esses microrganismos, e não funcionam, por exemplo, contra vírus. Tecnicamente, o termo é usado para definir os compostos de origem natural (produzidos por fungos ou outras bactérias) que eliminam bactérias patogênicas. Popularmente, no entanto, ele é empregado para as moléculas sintéticas ou semissintéticas que exterminam esses microrganismos. Há cerca de 12 classes de antibióticos. Cada uma atua em um ponto diferente da estrutura ou do funcionamento das bactérias (ver infográfico).


Expostas à concentração adequada dos antibióticos e por tempo suficiente, as bactérias facilmente morrem. Se a dosagem e duração do tratamento forem inferiores ao necessário para aniquilá-las, uma parte pode sobreviver e se multiplicar, acumulando alterações no material genético que permitem escapar à ação dos fármacos.
As bactérias estão em todos os lugares: na água, no solo, no ar e nas superfícies, inclusive do nosso corpo. Com o uso intensivo de antibióticos na saúde humana e na produção de alimentos, para proteger ou tratar os animais de criação de doenças e induzir ganho de peso, as bactérias são continuamente expostas a esses fármacos. Esse contato favorece a seleção das variedades resistentes.
“Estamos vendo surgir bactérias contra as quais não há mais medicamentos eficazes”, relata a infectologista brasileira Fernanda Lessa, chefe do programa internacional de controle de infecções dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos. Ela coordenou um suplemento especial sobre o assunto, publicado em julho de 2023 na revista Clinical Infectious Diseases, e afirma: “Por sorte as infecções causadas por esses microrganismos ainda são relativamente raras na comunidade e estão quase sempre restritas aos hospitais”.
Mesmo assim, as infecções por bactérias resistentes a múltiplos medicamentos – também chamadas de multirresistentes ou superbactérias – causam um estrago enorme. Um levantamento coordenado pelo epidemiologista Ramanan Laxminarayan, da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, estimou que, a cada ano, no mundo, ocorram 136 milhões de casos de infecção hospitalar causados por esses microrganismos. Segundo os dados, publicados em junho de 2023 na revista PLOS Medicine, a China é, de longe, a nação mais afetada, com 52 milhões de registros. O Brasil aparece em quinto lugar, com 4 milhões de casos.

No mundo todo, esses microrganismos foram os responsáveis diretos por 1,27 milhão de mortes em 2019. Quando se incluem os casos em que o indivíduo tinha outra doença além da infecção, esse número sobe para 4,95 milhões, próximo ao total de óbitos registrados em três anos de pandemia de Covid-19 e bem superior à soma das mortes anuais por malária, Aids e tuberculose.
Essas cifras foram calculadas por um grupo internacional de pesquisadores, do qual participaram brasileiros, com base em dados de 204 países. Publicado em 2022 na revista The Lancet, o trabalho mostra que quase 80% dos óbitos decorreram de infecções no trato respiratório inferior (bronquites e pneumonias), no sistema circulatório ou na cavidade abdominal.
Seis espécies de superbactérias foram responsáveis por ao menos 70% das mortes: Escherichia coli, Staphylococcus aureus, Klebsiella pneumoniae, Streptococcus pneumoniae, Acinetobacter baumannii e Pseudomonas aeruginosa. Todas integram a lista de patógenos prioritários, publicada em 2017 pela Organização Mundial da Saúde (OMS), contra os quais é preciso desenvolver novos antibióticos.


Com 14% da população mundial, os 35 países das Américas concentram aproximadamente 11% das mortes por infecções bacterianas resistentes a antibióticos. Foram 141 mil óbitos diretamente provocados por esses microrganismos e 569 mil associados a eles em 2019, segundo estudo publicado em agosto de 2023 na revista The Lancet Regional Health – Americas. Novamente, a grande maioria (80%) foi causada pelos seis patógenos. As ocorrências, em números absolutos, estão concentradas nas nações mais populosas: Estados Unidos e Brasil. Aqui, foram 33,2 mil mortes (cerca de 90 por dia) diretamente causadas por infecções resistentes e 138 mil nas quais as superbactérias tiveram alguma participação. “Os grupos mais afetados estão nos extremos da pirâmide etária da nossa população, os bebês de até 1 mês de vida e as pessoas com mais de 65 anos”, conta o pediatra Eitan Berezin, da Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo, um dos autores do estudo.

“Suspeito que hoje o número de mortes no Brasil e no mundo seja ainda mais elevado”, relatou Lessa, do CDC, em entrevista por videochamada em setembro. “Esses estudos usaram dados de 2019 e na pandemia de Covid-19 aumentou o consumo de antibióticos”, disse.


Dois estudos coordenados por ela e publicados em julho na Clinical Infectious Diseases indicaram essa tendência. Em um dos trabalhos, Lessa e colaboradores analisaram os registros de dispensação desses medicamentos em seis hospitais – dois no Brasil, dois no Chile e dois na Argentina – em dois períodos: entre março de 2018 e fevereiro de 2020 e no primeiro ano da pandemia. Com o aumento das internações após o surgimento do novo coronavírus, o uso de antibióticos cresceu nos seis hospitais (até 35%), algo antes observado nos Estados Unidos. No Brasil, também aumentaram as prescrições de antibióticos para tratar infecções respiratórias na comunidade. Entre janeiro de 2019 e março de 2020, foram receitados 19,9 milhões de doses, no primeiro ano da pandemia, 27,5 milhões, de acordo com o segundo estudo.

Antes mesmo do aparecimento do novo coronavírus já havia sinais do crescimento do consumo desses medicamentos no mundo. Laxminarayan, de Princeton, e colaboradores rastrearam a venda de antibióticos em 76 países de 2000 a 2015 e observaram dois efeitos. O primeiro foi um aumento de 65% na quantidade consumida, de 21,1 bilhões para 34,8 bilhões de doses diárias, segundo estudo publicado em 2018 na revista PNAS. O segundo é que cresceu quase 40% a proporção de pessoas usando esse tipo de medicamento: havia 11,3 doses diárias para cada mil habitantes em 2000 e 15,7 por mil em 2015. A elevação foi puxada pela melhora econômica em países de média e baixa renda. Apesar da subida, estima-se que 6 milhões de pessoas morram por ano no mundo por falta de acesso a antibióticos.
O aumento no uso desses fármacos, intensificado na pandemia, e a superlotação dos hospitais parecem ter contribuído para a dispersão de genes que permitem às bactérias se livrar de medicamentos.
No Brasil, essa tendência foi observada pelo infectologista Carlos Kiffer, da Unifesp, e colaboradores da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Eles analisaram os dados provenientes de testes genéticos de mais de 80 mil amostras de bactérias coletadas em hospitais de quase todo o país de 2017 a 2022 e constataram que, na pandemia, houve um aumento significativo (de 4 a 21 pontos percentuais) na frequência de genes que conferem a oito espécies de bactérias resistência aos carbapenêmicos, antibióticos considerados o último recurso para tratar infecções hospitalares graves. Klebsiella pneumoniae, Escherichia coli e Acinetobacter baumannii estavam entre os principais microrganismos, segundo o trabalho, publicado em julho na Clinical Infectious Diseases. “Havia evidências pontuais de que alguns desses genes estavam se tornando mais comuns no país. Ajudamos a dimensionar o problema”, conta Kiffer.


Para a infectologista Anna Levin, da USP, coordenadora do projeto de rastreamento citado no início desta reportagem, a ocorrência de infecções hospitalares por bactérias resistentes é um reflexo da qualidade do atendimento. “Quando o sistema está no limite, com excesso de pacientes e poucos profissionais para atender, as taxas de infecção aumentam”, afirma a pesquisadora, que preside a comissão de controle de infecção do Hospital das Clínicas da USP, o maior complexo de saúde do país. Durante a pandemia, o grupo de Levin conseguiu controlar a disseminação de infecções por bactérias multirresistentes no pronto-socorro do hospital ao submeter as pessoas que eram internadas a testes de detecção dos patógenos e isolar aquelas colonizadas, tratando-as separadamente.
Embora a resistência a antibióticos seja um problema antigo, só recentemente o mundo passou a prestar atenção a ele, por causa de dois documentos: um relatório de 2014 da OMS, que mostrou que o fenômeno estava disseminado pelo planeta, e um estudo conduzido pelo economista James O’Neill, a pedido do governo do Reino Unido, que projetou um cenário catastrófico para 2050. Se nada for feito, as infecções resistentes aos antibióticos deverão causar 10 milhões de mortes por ano na metade do século e provocar perdas na economia que podem chegar a US$ 100 trilhões.
Em sua edição de 2016, o livro Microbiologia de Brock, adotado em cursos da área da saúde, informa que ao menos 10 mil toneladas de antibióticos são produzidas por ano no mundo e utilizadas na saúde humana e animal. Uma consequência é que esses produtos, mesmo quando usados de forma correta, contaminam o ambiente, favorecendo o surgimento de bactérias resistentes. “No Brasil, não é obrigatório tratar o esgoto hospitalar para a eliminação de bactérias presentes na urina e fezes dos pacientes ou no ambiente hospitalar. Não temos um bom sistema de vigilância que integre a frequência de microrganismos resistentes nos hospitais e monitore a sua disseminação para a comunidade e o meio ambiente”, conta Ana Gales, a infectologista da Unifesp que estuda o assunto.

Nos últimos anos, uma série de trabalhos trouxe evidências de que o problema que deveria ser predominantemente hospitalar já se acentuou no ambiente. A equipe da farmacêutica bioquímica Eliana Stehling, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da USP, acompanha a dispersão de bactérias multirresistentes a antibióticos em quase 50 cidades no norte do estado e já detectou esses microrganismos em amostras de solos de áreas agrícolas e de criação de animais, além de águas de rios, córregos e riachos. “No ambiente, em especial na água, esses fármacos podem selecionar superbactérias, acelerando a dispersão da resistência antimicrobiana, uma vez que esses microrganismos trocam material genético entre si”, conta o farmacêutico João Pedro Furlan, do grupo de Ribeirão Preto.
No campus de São Paulo da USP, o microbiologista chileno Nilton Lincopan e sua equipe já identificaram bactérias resistentes onde quer que se possa imaginar. Elas estão na água dos rios Tietê e Pinheiros, que cortam a capital, e infectando tartarugas, pinguins, baleias e golfinhos, além de aves marinhas, no litoral brasileiro. “Registramos uns 30 casos nos últimos quatro anos”, conta o pesquisador.
Também foram encontradas em cães e gatos atendidos em clínicas e hospitais veterinários da cidade e em amostras de alface, rúcula e repolho frescos vendidos no principal entreposto comercial de São Paulo. “Algumas variedades são resistentes ao ambiente ácido. Isso significa que podem sobreviver à passagem pelo estômago e colonizar o intestino de quem come uma verdura mal lavada”, explica Lincopan.
O fenômeno que se observa há mais tempo entre as bactérias ocorre também com os fungos, embora seja mais difícil de mensurar pela falta de dados. Por essa razão, em 2022, a OMS lançou a primeira lista de patógenos fúngicos prioritários para planejamento de ações de saúde pública. Nela, foi incluída a levedura Candida auris, que vem causando surtos em hospitais de todos os continentes. “As infecções por fungos multirresistentes aos medicamentos existentes são menos comuns, mas podem ser mais letais que as bacterianas”, afirma Colombo, da Unifesp, um estudioso do problema.
Diante desse cenário, os especialistas recomendam algumas medidas. As mais simples e abrangentes, a serem praticadas por todos, são realizar boa higiene pessoal e dos alimentos, além de se vacinar contra os microrganismos para os quais há imunizante, como certas bactérias causadoras de pneumonia, tuberculose e meningite. Outra é usar de modo otimizado e rigoroso os medicamentos. Os médicos devem prescrever antibióticos apenas para as infecções bacterianas, se possível com o auxílio de testes que permitam saber qual o fármaco mais adequado para cada caso, e antifúngicos para as infecções por fungos. Já o paciente deve usar a dose recomendada e pelo tempo indicado, mesmo que melhore antes. Sempre que possível, o ideal é manter-se longe dos hospitais e, quando necessário, passar neles o menor tempo possível.

Projetos
1. Instituto Paulista de Resistência aos Antimicrobianos (Projeto Aries) (nº 21/10599-3); Modalidade Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid); Pesquisador responsável Arnaldo Lopes Colombo (Unifesp); Investimento R$ 15.021.964,28.
2. Rede multidisciplinar internacional para caracterização de aspectos microbiológicos e da história natural de Infecções Fúngicas Invasivas (IFI) por espécies do gênero Candida (nº 17/02203-7); Modalidade Projeto Temático; Pesquisador responsável Arnaldo Lopes Colombo (Unifesp); Investimento R$ 1.328.821,49.
3. Rastreamento e isolamento precoce de pacientes colonizados por enterobactérias resistentes a carbapenêmicos admitidos no pronto-socorro (nº 18/06016-0); Modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular; Pesquisador responsável Icaro Boszoczowski (FM-USP); Investimento R$ 114.610,59.
4. Resistoma, plasmidoma e viruloma de Enterobacterales isoladas do meio ambiente carreando genes mcr-like (nº 21/01655-7); Modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular; Pesquisadora responsável Eliana Guedes Stehling (USP-RP); Investimento R$ 199.956,01.
5. Estudo do perfil de resistência, virulência e epidemiológico de Escherichia coli isoladas do meio ambiente (nº 18/01890-3); Modalidade Bolsa de Doutorado; Pesquisadora responsável Eliana Guedes Stehling (USP-RP); Bolsista João Pedro Rueda Furlan; Investimento R$ 150.141,19.
6. One Health Brazilian Resistance (OneBR): Base genômica integrada para vigilância, diagnóstico e tratamento da resistência aos antimicrobianos na interface humana-ambiente-animal, no Brasil (nº 20/08224-9); Modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular; Pesquisador responsável Nilton Erbet Lincopan Huenuman (USP); Investimento R$ 241.806,62.
7. Viruloma e patogenicidade de linhagens bacterianas prioritárias em saúde única resistentes a carbapenêmicos e polimixinas (nº 19/15578-4); Modalidade Bolsa de Doutorado; Pesquisador responsável Nilton Erbet Lincopan Huenuman (USP); Bolsista Fernanda Ribeiro dos Santos Esposito; Investimento R$ 190.601,93.
8. Pan-resistoma de Klebsiella pneumoniae e Escherichia coli produtoras de beta-lactamases (KPC-2, CTX-M-8, CTX-M-15) endêmicas no Brasil (nº 16/08593-9); Modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular; Pesquisador responsável Nilton Erbet Lincopan Huenuman (USP); Investimento R$ 214.075,41.
9. Análise comparativa do resistoma de Klebsiella pneumoniae XDR (NDM-1/KPC-2) pertencente ao complexo clonal (CC) endêmico de alto risco CC258 (nº 15/21325-0); Modalidade Bolsa de Doutorado; Pesquisador responsável Nilton Erbet Lincopan Huenuman (USP); Bolsista Louise Teixeira Cerdeira; Investimento R$ 131.634,25.

Artigos científicos
ANTIMICROBIAL RESISTANTE COLLABORATORS. Global burden of bacterial antimicrobial resistance in 2019: A systematic analysis. The Lancet. 19 jan. 2022.
ANTIMICROBIAL RESISTANTE COLLABORATORS. The burden of antimicrobial resistance in the Americas in 2019: A cross-country systematic analysis. The Lancet Regional Health ‒ Americas. 8 ago. 2023.
FURLAN, J. P. R. et al. Early dissemination of novel NDM-1-producing Klebsiella pneumoniae ST6326 to the environment. Journal of Global Antimicrobial Resistance. set. 2023.
MARTINS, W. M. B. S. et al. SPM-1-producing Pseudomonas aeruginosa ST277 clone recovered from microbiota of migratory birds. Diagnostic Microbiology and Infectious Disease. mar. 2018.
NARCISO, A. C. et al. Detection of OXA-58-producing Acinetobacter seifertii recovered from a black-necked swan at a zoo lake. Antimicrobial Agents and Chemotherapy. 22 nov. 2017.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

Por que execução com nitrogênio é vista como possível tortura pela ONU

(NOTA DO BLOG: A publicação desta notícia não pode ser correlacionada com nenhum apoio deste Blog à pena de morte ou à condescendência com crimes hediondos.)

Link do texto completo: https://www.bbc.com/portuguese/articles/c25dn0gjdp8o

Resumo: Antes da quinta-feira (25/01/2024), Kenneth Eugene Smith já sabia o que era caminhar em direção à morte e entrar em uma câmara de execução.

Smith foi condenado pelo assassinato de Elizabeth Sennett em 1988. Ele deveria ter recebido uma injeção letal, mas o procedimento foi adiado após falhas. O caso de Smith foi uma das três tentativas fracassadas de administração de injeção letal desde 2018 nos Estados Unidos. Mas o seu caso abriu caminho para o uso de um novo e controverso método de execução que as Nações Unidas consideram "cruel, desumano e degradante".

Nos últimos dias, Smith e sua equipe jurídica tentaram interromper o processo com vários recursos. Na quarta-feira (24/1), eles tentaram, no 11º Tribunal de Apelações do Circuito dos EUA, refutar a legalidade do protocolo de execução com gás nitrogênio estabelecido pelo estado do Alabama. Chegaram a pedir a intervenção da Suprema Corte em duas instâncias, mas todos os pedidos foram rejeitados. A execução aconteceu na quinta-feira.

Nitrogênio em vez de oxigênio

Smith foi condenado pelo assassinato, em 1988, de Elizabeth Sennett, esposa de um pastor. Sennett foi esfaqueada e espancada até a morte em um assassinato encomendado por seu marido para receber o seguro de vida, segundo a decisão do tribunal que analisou o caso. No julgamento, Smith admitiu ter estado presente quando a vítima foi assassinada, mas afirmou não ter participado do ataque.


O júri o considerou culpado por decisão quase unânime (11 a 1) e recomendou prisão perpétua sem possibilidade de liberdade condicional, mas o juiz o condenou à morte. 

Mais de 30 anos depois, Smith se tornou a primeira pessoa a ser executada por hipóxia de nitrogênio nos Estados Unidos e, segundo o Centro de Informações sobre Pena de Morte, no mundo. Este método controverso funciona ao privar o corpo de oxigênio por meio da respiração de nitrogênio puro.

(NOTA DO BLOG: Ao respirarmos exclusivamente nitrogênio, em alguns minutos cessa o transporte de oxigênio pelo sangue, provocando a asfixia do indivíduo. Se o indivíduo - como parece ter sido o caso - fizer umas inspirações profundas antes, o tempo de execução pode se prolongar muito, com muito sofrimento.)

ONU denuncia possível tortura

A ONU expressou sérias preocupações sobre este caso por meio do seu Gabinete de Direitos Humanos. O órgão exigiu que o estado do Alabama suspendesse a execução de Smith, considerando que poderia resultar em tortura.

"Estamos preocupados que a execução de Smith nestas circunstâncias possa violar a proibição de tortura ou outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, bem como o seu direito (de pessoa condenada) a soluções eficazes", disse Ravina Shamdasani, porta-voz do Escritório de Direitos Humanos.


 Lembrou que ambos os direitos estão incluídos em dois tratados internacionais de direitos humanos assinados pelos Estados Unidos: o Pacto sobre os Direitos Civis e Políticos e a Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes.

A representante das Nações Unidas argumentou que, segundo "evidências periciais", a execução por hipóxia de nitrogênio pode causar "dor e sofrimento" ao condenado.

O Gabinete dos Direitos Humanos da ONU também está preocupado com o fato de o Alabama não contemplar no seu protocolo o fornecimento de um sedativo ao prisioneiro antes de executá-lo.

"Mesmo a Associação Médica Veterinária Americana recomenda a administração de um sedativo a animais de grande porte quando os sacrificamos dessa maneira, enquanto o protocolo do Alabama para execução por asfixia com nitrogênio não prevê sedação", disse Shamdasani.

Além disso, criticou o fato da utilização de um método nunca antes utilizado e reiterou a posição da ONU contra a pena de morte em geral.

"Em vez de inventar novas formas de aplicar a pena capital, instamos todos os Estados a estabelecer uma moratória sobre a sua utilização, como um passo em direção à abolição universal", disse ela.

Falta de evidência científica

Alguns profissionais médicos alertaram que a hipóxia por nitrogênio poderia causar uma série de acidentes catastróficos, desde convulsões violentas até a sobrevivência em estado vegetativo. Observou-se também que poderia haver risco para as demais pessoas presentes na sala, embora no caso de Smith não tenha havido vazamentos.

O próprio prisioneiro disse à BBC que sofria "ataques de pânico regulares" por medo de ser executado por um método não testado.

O Alabama tem uma das taxas de execução per capita mais altas dos Estados Unidos e tem 165 pessoas atualmente no corredor da morte. Desde 2018, o estado é responsável por três tentativas fracassadas de injeção letal, nas quais os condenados sobreviveram.

Isso levou à aprovação, juntamente com Oklahoma e Mississipi, de um método alternativo de execução, já que as drogas utilizadas em injeções letais se tornaram mais difíceis de encontrar, contribuindo para o declínio do uso da pena de morte em todo o país.

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

Projeto da UFV promove conscientização sobre a importância das abelhas

Link para matéria completa: https://www.folhadamata.com.br/ufv/noticias/projeto-da-ufv-promove-conscientizacao-sobre-a-importancia-das-abelhas

Resumo: Atividades do projeto são desenvolvidas em escolas públicas viçosenses

Alunos participantes dos projetos durante uma visita ao Apiário Central da UFV

As abelhas constituem o principal grupo de polinizadores e, por essa razão, são componentes vitais em todos os ecossistemas terrestres, pois a polinização é indispensável para a reprodução da maioria das plantas, tanto silvestre, quanto cultivadas. Dessa forma, as abelhas têm grande importância econômica e ambiental. Muitas espécies de abelhas, entretanto, são sensíveis a ações antrópicas como o desmatamento, queimadas e uso de agrotóxicos. Essas ações têm causado uma diminuição das populações naturais destes insetos e hoje, algumas espécies são consideradas ‘ameaçadas de extinção’.

Neste contexto, o trabalho de uma equipe multidepartamental e multicampi da Universidade Federal de Viçosa (UFV) busca oferecer alternativas para a conscientização da sociedade sobre a necessidade de preservação destes insetos. 

Desde 2022, essa equipe, coordenada pela Profa. Mara Garcia Tavares, do Departamento de Biologia Geral está desenvolvendo dois projetos, financiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG): o ‘Abelhas como ferramenta para promoção de conhecimentos e troca de saberes entre universidade, escola e sociedade’ e o ‘De olho nas abelhas: uma abordagem multidisciplinar visando a promoção de conhecimentos e a conservação ambiental’,

O primeiro projeto tem como objetivo compartilhar e difundir conhecimento científico com o propósito de ampliar o conhecimento da sociedade sobre a importância biológica, os riscos de extinção e a necessidade de conservação das abelhas. O segundo projeto, por sua vez, desenvolve atividades baseadas em investigação por projetos e atividades de educação cidadã para aproximar a sociedade e a ciência, considerando possibilidades para uma formação mais realista e mais ativa. Em conjunto, os dois projetos almejam a conscientização da comunidade sobre a importância das abelhas para o ambiente e a necessidade da preservação deste importante grupo de polinizadores.

As atividades dos projetos envolvem alunos dos 6º, 7º, 8º e 9° anos do Ensino Fundamental e alunos do 1º ano do Ensino Médio das escolas E. E. Alice Loureiro, E. E. José Lourenço de Freitas, E. E. Effie Rolfs, E. E. Dr. Raimundo Alves Torres (ESEDRAT), E. M. Almiro Paraíso e E. M. Dr. Arthur Bernardes. Para a Profa. Mara Tavares, ‘trabalhar com alunos de escolas com diferentes perfis está sendo gratificante e fundamental para entendermos a percepção dos alunos sobre a presença e a importância das abelhas para o ambiente’, de modo a destacarmos também, a necessidade de sua preservação. Vários alunos, das escolas mais próximas da zona rural, por exemplo, comentaram que possuem uma ou algumas caixas de jatai em casa e que seus pais as mantém por ‘hobby’, enquanto alunos das escolas mais centrais de Viçosa relataram nunca terem percebido a presença de ninhos de abelhas sem ferrão em postes, muros ou árvores’.

Neste primeiro ano do projeto, os alunos participaram de trilhas ecológicas para a identificação de ninhos de abelhas, na UFV e no entorno das escolas, e visitaram o Apiário Central da Universidade Federal de Viçosa, onde puderam conhecer diferentes espécies de abelhas sem ferrão. Eles também participaram de oficinas e de atividades do Clube de Ciências, para conhecer melhor a morfologia das abelhas, aprender a confeccionar ninhos armadilhas para a coleta de enxames naturais e a dividir colônias. Nos Dias de Campo, os alunos coletaram diferentes espécies de abelhas e puderam perceber a diversidade morfológica e de tamanho entre elas. Após a coleta, eles aprenderam a fixar e montar os espécimes, visando a confecção de coleções entomológicas. Além das atividades citadas, também ocorreram palestras nas escolas parceiras sobre a importância das abelhas para o ambiente, como deixar o ambiente mais atrativo para as abelhas e a importância da polinização, além de minicursos para produtores rurais.

Segunda a Profa. Mara Tavares, essas ações conferem visibilidade a este importante grupo de polinizadores e despertam o interesse dos alunos para a necessidade de ajudar a conservar suas populações. Isto ocorre porque as atividades dos projetos foram pensadas para estimular o engajamento dos alunos, que se sentem motivados e se tornam multiplicadores das informações, ajudando na difusão de conhecimento”. O bolsista do projeto “De olho nas abelhas”, Davis Francisco de Paula destaca ainda que “para ajudar a difundir conhecimentos sobre as abelhas sem ferrão e a importância de se conservar as abelhas, de modo geral, ‘a equipe criou duas páginas no Instagram (@abelhudosufv e @deolhonasbaelhas), um canal no You Tube (@deolhonasabelhas) e um projeto de Ciência Cidadã na plataforma iNaturalist (https://www.inaturalist.org/projects/ufv-de-olho-nas-abelhas). Assim, a equipe e a sociedade podem ter canais para a contínua troca de experiência e aprendizado”. Sobre a plataforma iNaturalist, em particular, o Prof. Helder Canto Resende, do Campus de Florestal, que participa dos dois projetos citados, ressalta que “é uma oportunidade de troca de saberes e uma experiência participativa na produção do conhecimento científico. Nessa plataforma, qualquer pessoa, com um celular na mão e um olhar atento, pode fazer uma observação e registrar a ocorrência das abelhas. A imagem feita com a câmera do celular é enviada pelo próprio observador, o que permitirá a identificação das espécies pelos especialistas do grupo e um mapeamento de onde estas abelhas vivem. Assim todas as pessoas podem colaborar para o conhecimento científico a respeito das abelhas".

Nos próximos dois anos, as palestras, minicursos, oficinas, Dias de Campo e as atividades dos Clubes de Ciências continuarão. A equipe pretende ainda, desenvolver um jogo sobre a vida das abelhas em uma colônia, uma cartilha educativa e realizar atividades com os professores das escolas parceiras e produtores rurais de Viçosa e região. A expectativa é que, ao final, os diversos segmentos da população envolvidos, em especial os alunos, percebam-se como agentes nos esforços para a preservação desses insetos e até vê-los como possível fonte de renda, explica a Profa. Carolina Gonçalves Santos, do DBG, que também participa dos dois projetos em questão.

O desenvolvimento dos projetos também está impactando positivamente a formação profissional dos bolsistas. A bolsista do projeto “de olho nas abelhas”, Rhiala Gomes Albergaria destaca que “a participação no projeto tem sido gratificante, pois, poder acompanhar de perto a empolgação e a troca de saberes com os alunos das escolas é empolgante. Além disso consigo ver a expansão do meu próprio aprendizado sobre as abelhas, pois, aprendo coisas novas ao longo do projeto”. Para a bolsista Ana Luiza Soares, do projeto ‘Abelhas como ferramenta para promoção de conhecimentos’, “é interessante ver como os alunos participam ativamente das atividades e trazem conhecimentos prévios sobre as abelhas, de acordo com suas realidades. Sempre estou aprendendo algo novo e melhorando minha formação pessoal e profissional”. 

Ao mesmo tempo, a experiência tem sido positiva para as escolas parceiras. A coordenadora Janayna Avelar Motta, que atua na E. M. Almiro Paraíso comenta que "O projeto ‘De olho nas abelhas’ foi muito bem recebido pelos alunos e professores da escola. As atividades propostas condizem com a realidade das nossas crianças e, com isso, elas demonstram interesse no assunto. Além disso, os integrantes sempre propõem experiências como, por exemplo, dinâmicas com caixas de abelhas, debates, imagens e palestras instigando as crianças a expressar suas ideias. Estes momentos têm sido uma experiência de muitos aprendizados para toda a escola. Esperamos que o projeto continue proporcionando essas vivências no espaço escolar".

Um outro aspecto foi destacado pela Profa. Patrícia Pinheiro de Campos Fonseca Rodrigues (Professora de Ciências e Biologia da ESEDRAT). Para ela, “o projeto ‘Abelhas como ferramenta para promoção de conhecimentos’ tem despertado, nos estudantes participantes, outro olhar, não somente para com a diversidade ambiental, mas também para com o respeito em relação à preservação desses insetos, pois, eles entendem que as espécies vegetais e, consequentemente, animais dependem amplamente do processo contínuo de polinização”. O interesse e o engajamento dos alunos pelo tema pode ser evidenciado na Feira de Ciências da Escola, que aconteceu no dia 18 de novembro. Nesta atividade, um grupo de alunos do 9º ano do Ensino Fundamental criou cartazes para explicar a importância e as consequências do desaparecimento das abelhas.

Com os resultados obtidos até o momento, a Profa. Mara conclui que, ‘apoiando iniciativas como estas, a Universidade incentiva a divulgação de conhecimentos gerados por seus professores, alunos e técnicos. Os projetos citados, em particular, buscam envolver o público no diálogo sobre a importância das abelhas sem ferrão para os diversos biomas e ajudar na tomada de decisões sobre a necessidade de conservação destes insetos, que são fundamentais para o ambiente em que vivemos”. Os resultados obtidos neste primeiro ano dos projetos foram publicados em alguns Eventos Científicos e os interessados em aderir às propostas e auxiliar na conservação das abelhas podem entrar em contato pelas páginas do Instagram dos projetos.

Alunos participando de trilhas ecológicas para identificação de ninhos e coleta de abelhas no distrito de Silvestre